Vale ver na Netflix: O Dilema das Redes (The Social Dilemma)
2020 | 1h34 de duração | Classificação: 12 anos | nota 9
Na época que a Netflix lançou este documentário, “O Dilema das Redes“, estávamos mais do que nunca imersos nas redes sociais. Era, afinal, o auge da pandemia da Covid-19, ainda sem vacina à vista, e com todos isolados dentro de casa e usando a internet para trabalhar, se comunicar com os outros, interagir com os amigos ou simplesmente para passar o tempo.
Eu não quis ver. Já estava totalmente esgotada pelo trabalho, também com internet, e pela pandemia, que eu noticiava freneticamente. Já estava também exaurida pelos efeitos perversos das fake news, que se propagam bem mais rápido que os desmentidos – e, naquele momento, a desinformação era ainda mais grave que em qualquer momento anterior, porque estava ajudando a matar pessoas.
Portanto, pensei que assistir a este documentário, que estava fazendo muito sucesso entre meus colegas e amigos, me deixaria ainda mais deprimida. Acabei me esquecendo dele.
Até que recentemente fui assistir a outro documentário, lançado neste ano, por indicação do professor de mestrado do meu marido na UFOP: “A Rede Antissocial“. Gostei muito, como escrevi aqui no blog, e pensei muito sobre as informações que ele explicava didaticamente ali.
Lembrei do documentário de quatro anos atrás e achei que agora fazia mais sentido assistir a ele, até para complementar as informações deste que foi lançado em 2024. E assim fiz.
A verdade é que “O Dilema das Redes” não traz nenhuma novidade para quem estuda comunicação e estuda o que está acontecendo no mundo da internet, como eu faço há anos (trabalho com jornalismo digital há mais de dez anos, fora minha experiência com blogs, que já passou dos vinte).

Tudo o que é mostrado lá eu não só já sabia, como já escrevi várias vezes a respeito aqui neste mesmo blog (veja alguns exemplos de posts ao final deste). Por exemplo:
- que as redes sociais deixaram as pessoas totalmente viciadas,
- que contribuíram com a polarização em todo o mundo,
- que deram um gás nos grupos extremistas e nos discursos de ódio,
- que impactaram em eleições, favorecendo também os candidatos populistas e extremistas,
- que fizeram as fake news, as teorias conspiratórias e a desinformação como um todo explodir,
- que deixaram as pessoas mais agitadas e ansiosas (vejam o que escrevi ainda em 2013: “estamos cada dia mais apressados e que essas tecnologias trabalham para sempre nos apressarem mais. Mas o ritmo do mundo, da natureza e até do nosso organismo é mais lento. Será que essas tecnologias estão nos ajudando a ter mais qualidade de vida ou mais constantes ansiedade e estresse?“)
- que contribuíram para a piora na saúde mental e autoestima, aumentando os casos de depressão, automutilação e suicídio, principalmente entre os adolescentes e pré-adolescentes,
- e assim por diante.
Também já estava bem claro para mim, há um bom tempo, que as redes sociais são tão bem-sucedidas porque exploram nossos comportamentos, e utilizam os zilhões de dados coletados sobre nós para vender mais e melhor, além de serem capazes mudar nossas rotinas, hábitos e comportamentos para atender aos interesses de quem paga mais.
Tudo isso é feito de forma sutil, manipuladora, persuasiva e nada transparente com os chamados “usuários”. É o mais puro suco de marketing.

3 razões para ver ‘O Dilema das Redes’ o quanto antes
OK, se não tem novidades, pra que assistir a este documentário então?
Porque:
1- Nem todo mundo sabe dessas coisas (como eu disse, eu sei porque estudo o assunto há anos), e o documentário é extremamente didático com os conceitos, facilitando o entendimento até para quem não sabe, por exemplo, o que é um algoritmo.
2- Porque eles conseguem condensar, em uma hora e meia, uma tonelada de questões diferentes, que passam por tecnologia, negócios, saúde e política, e poucas vezes vi esse assunto ser tratado de forma tão abrangente e completa como em “O Dilema das Redes”.
3- Porque as pessoas que eles entrevistam para o documentário são ex-chefões de big techs poderosas, que participaram ativamente da construção da tecnologia do Google/YouTube, Facebook, Instagram, Twitter e outras. Ou seja, são pessoas que, além de conhecerem a fundo a tecnologia por trás dessas redes sociais, conhecem os bastidores de sua criação, incluindo o que há de mais podre nas intenções dos bilionários do Vale do Silício. O doc também entrevista professores doutores que pesquisam o assunto bem de perto, e contribuem com suas observações.

Adianto, no entanto, que, como eu previra há quatro anos, e como aconteceu quando vi “A Rede Antissocial”, acabei ficando deprimida depois de ver este “O Dilema das Redes”. É mais um reforço para o pessimismo em que ando afundada, uma desesperança profunda de que as coisas tendem a piorar cada vez mais, e que talvez não haja mais tempo ou meio para conserto.
Mas, de novo: é um filme de utilidade pública, por trazer alertas importantes e abrir os olhos daqueles que talvez nunca tenham tido acesso a esse tipo de informação. Deveria ser exibido nas escolas, principalmente, para que a geração dos hoje pré-adolescentes possa ter um olhar mais crítico para essa grande “matrix” em que estamos todos vivendo.
Como diz um dos entrevistados: “A crítica é o que leva à criação de algo melhor. Os críticos é que são os verdadeiros otimistas”.
E deveria ser também levado a sério pelos governos de todo o mundo, que lutam bravamente contra os Elon Musks da vida para tentar regulamentar essa bagunça – mas que deveriam lutar ainda com mais afinco, e mais urgência, porque talvez esta seja a única forma de conter mais estragos.
A tecnologia é linda? A inteligência artificial facilita muito nossa vida? Sem dúvida, sem dúvida. Mas existe um outro lado da moeda, uma distopia, que nem a imaginação fértil de um Isaac Asimov era capaz de prever. E que já estamos vivendo.
- Leia no próximo post: O que VOCÊ pode fazer para combater os problemas causados pelas redes sociais?
Assista ao trailer oficial de O Dilema das Redes:
Alguns dos vários posts que publiquei neste blog, de 2011 pra cá, abordando os problemas tratados em “O Dilema das Redes”:
- 2011: Pra que servem as redes sociais??
- 2011: Luto pelo email
- 2011: Sete anos depois, o fim do Orkut
- 2011: Internet: antro de covardes anônimos
- 2011: Memórias virtuais
- 2012: Todo mundo respeita os outros no metrô (ao menos nos comentários)
- 2012: Sua vida na rede
- 2013: O caso de dois viciados em smartphones e tablets
- 2013: Finalmente, surgem as reações aos viciados em smartphones
- 2013: Oito motivos para deletar a conta do Facebook (mas nunca deletamos)
- 2013: Redes sociais e um mundo de mortos-vivos
- 2013: Geração Robocop
- 2013: De como não sentimos falta daquilo de que não precisamos
- 2013: O homem que enxergava
- 2013: Quanto mais Facebook, mais infelizes somos (ou não)
- 2014: De essencial a obsoleto
- 2014: Sobre cartas que viraram emails que viraram tweets (que viraram nada)
- 2014: ‘Ela’: um mundo com menos toques
- 2015: A ‘elalização’ do mundo, em três cenas
- 2015: Reflexões sobre a morte da internet
- 2016: Comentários na web e o ódio contra mulheres, gays e minorias
- 2017: Por menos gritos, muros e ódio nos discursos dos meus amigos de Facebook
- 2017: Se dirigir, não mande WhatsApp
- 2019: De quando não tínhamos só uma tela pela frente
- 2019: O smartphone é mais viciante que o cigarro – e é isso que as gigantes da tecnologia querem
- 2019: Como reduzir o uso do smartphone: 11 coisas que eu fiz e que funcionaram
- 2020: Por que eu deletei o Facebook (há um ano e meio) e como a vida melhorou depois disso
- 2021: Você já perdeu alguém que ama para as teorias conspiratórias?
- 2022: 10 ideias para se desconectar da rotina de trabalho e das telas
- 2022: Fato ou boato? 10 passos para identificar notícias falsas
- 2022: Precisamos repensar o WhatsApp no trabalho
- 2023: ChatGPT por ele mesmo: entrevista com o robô do momento
- 2023: Tudo sobre a OpenAI, o ChatGPT e o GPT-4
- 2023: Fake news: como identificar e combater esse mal moderno
- 2023: Precisamos falar sobre a falsa urgência no trabalho
- 2024: ‘Sabrina’: como as fake news e as conspirações são criadas
- 2024: ‘A Rede Antissocial’: um filme de terror real
- 2024: Fake news: ‘Como vivem? Onde comem? O que fazem?’
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