Jornalistas agora têm que lutar contra fake news, coronavírus e o fascismo
Há poucos dias, o presidente da República, Jair Bolsonaro, mandou jornalistas calarem a boca. Ele foi tão infeliz que, horas depois, apareceu pra pedir desculpas.
Os jornalistas que ouviram o “cala-boca” estavam fazendo seu trabalho, qual seja, questionando o chefe do Executivo sobre as denúncias de interferência na Polícia Federal que partiram de seu – até outro dia mesmo – ministro da Justiça, o juiz Sergio Moro.
Fora o “cala boca”, já houve diversos outros momentos em que o presidente do Brasil aproveitou seu palanque, diante de seus fãs da seita do bolsonarismo, para ofender a imprensa. Chegou a levar um exemplar da “Folha de S.Paulo” para achincalhar o jornal paulista.
Vale destacar o que diz Juan Arias em seu artigo no “El País” no dia 5 de maio: “Quase todas as rupturas democráticas na história moderna começaram da mesma maneira: com ataques à liberdade de expressão e ao Congresso“. No caso do Brasil, os ataques se estendem a todo e qualquer sujeito ou instituição que faça qualquer crítica ao governo Bolsonaro, aí incluindo o STF, o ex-amigo Sergio Moro, o ex-amigo Alexandre Frota, a ex-amiga Janaina Paschoal etc.
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Não é coincidência que a imprensa seja sempre alvo de pessoas com pretensões ditatoriais, como Bolsonaro e seus fieis seguidores fanáticos. A imprensa é um dos principais instrumentos da democracia. E é papel dos jornais sérios questionar os governantes, para que eles deem respostas à população em geral. Também é papel dos jornalistas verificar a veracidade das informações e divulgar fatos. Por exemplo, mostrar que todas as últimas pesquisas científicas recentes demonstraram que a cloroquina é ineficaz no combate ao coronavírus e tem tido até efeitos colaterais graves para quem insiste em usá-la. É papel do jornalismo sério divulgar à população as informações do meio científico, e não só ficar reproduzindo o que diz o presidente, que não é cientista, mas resolveu colocar mais este ingrediente em sua guerra de informação.
Sim, porque o que ele promove, com auxílio de seu “gabinete do ódio“, é uma guerra de notícias. Enquanto os jornalistas tentam informar a população sobre o ineditismo que estamos vivendo com esta pandemia sem precedentes na história, sobre a importância do isolamento para achatar a curva da contaminação, sobre a importância para a saúde pública de todos usarem máscaras e se protegerem, Bolsonaro e seus seguidores insistem em divulgar vídeos e mensagens apócrifas, com uso preferencial do WhatsApp, para dizer que “é só uma gripezinha”, que a cloroquina é milagrosa, que o comércio tem que reabrir e que tudo bem sair às ruas sem máscara, juntar aglomerações em atos pedindo a volta do AI5, tudo bem “fazer um churrasco para uns 30” etc.
Desinformação e fake news, como estas que ele ajuda a espalhar, geram danos muitas vezes irreparáveis. Por exemplo, as 15 mil mortes pela Covid-19 no Brasil (até agora, mas o número segue crescendo) são um dano irreparável. Lembrando que esses números são do próprio Ministério da Saúde, do governo federal. Mas o chefe do governo federal responde a eles com um sonoro “E daí?“…
Há rostos e histórias por trás de todas essas pessoas. E, sim, muitas delas estavam com outras doenças ou tinham fatores de risco que agravaram o quadro e levaram à morte. Mas isso não significa que morreriam de todo jeito. Hipertensos vivem muitos anos de forma controlada e saudável. Diabéticos idem. Foi o coronavírus que os matou, não o fator de risco que carregavam.
Isso para não falar dos vários casos de pessoas sem qualquer comorbidade, que sucumbiram ao vírus letal. Como o sr. João Batista Bueno, de Ouro Fino. Ou o sr. Cláudio Manoel Ricardo, de Montes Claros, que falava que o coronavírus era “coisa da mídia”. Ou o jovem Matheus, de Betim, totalmente saudável e que tinha apenas 23 anos.
Enfim, desinformação e fake news mata. E mata até quem estava plenamente saudável. Mas também gera outras consequências graves. Não é à toa que está sendo combatida até no Congresso. E é por isso que exitem jornalistas profissionais, que prestam um serviço inestimável à democracia, ao incomodar os Três Poderes, mostrar onde estão falhando, cobrar para que façam melhor, divulgar erros ou mesmo crimes que estejam ocorrendo na sociedade etc. Jornalismo bom é, sim, o jornalismo que incomoda, como bem pontuou o Sindicato dos Jornalistas de Minas:
Chega a ser triste pensar que é preciso dizer que “jornalista bom é jornalista vivo”, né? Deveríamos desejar que todos pudessem trabalhar em segurança e permanecer vivos, apesar de seus trabalhos, não é mesmo? Mas não é o que vem acontecendo. O que me leva de volta ao início do meu post. Quando o próprio presidente da República é agressivo com os jornalistas, é óbvio que seus seguidores fanáticos também o serão.
E as consequências disso já estão notáveis. Recentemente, jornalistas foram agredidos em um ato pró-Bolsonaro. A Federação Nacional dos Jornalistas fez um relatório em que apontou aumento de 54% dos casos de violência contra jornalistas apenas entre 2018 e 2019. Bolsonaro foi responsável – sozinho – por 121 desses ataques (58,17%). O número certamente já explodiu só nestes primeiros quatro meses e meio de 2020.
Na última semana, em Belo Horizonte, picharam num tapume, na região hospitalar da cidade, os seguintes dizeres:
O Sindicato dos Jornalistas de Minas agiu rápido: Alessandra Mello e Kerison Lopes foram até o local e o cobriram com frases com os dizeres: “Respeita os jornalistas!”, “Viva os jornalistas”, “Informação combate pandemia”, “Sou jornalista e não me calo”, “Jornalista bom é jornalista vivo!” e “Jornalista bom é jornalista que incomoda”. VEJA O VÍDEO AQUI.

Deixo aqui meu muito obrigada aos dois por este ato corajoso.
Mas eles não pararam aí. Fizeram um boletim de ocorrência e pediram ao chefe do primeiro departamento de Polícia Civil de Belo Horizonte, Wagner Salles, que abrisse um inquérito para apuar quem é o autor das pichações pregando morte a jornalistas.
“O delegado que investiga o caso disse que todos os esforços serão empreendidos para tentar apurar o responsável pelas pichações que, segundo ele, atingem toda uma classe de trabalhadores e “também a democracia”. De acordo com Salles, serão requisitadas imagens das câmeras de segurança da região na tentativa de identificar quem está pregando a violência contra os jornalistas”, diz o texto do sindicato.
Mais: nesta sexta-feira (15) o Ministério Público de Minas Gerais divulgou que também vai acompanhar o inquérito. O procurador-geral de Justiça, Antônio Sérgio Tonet, designou quatro promotores para acompanharem a investigação.
“Antônio Sérgio Tonet afirmou que o MPMG repudia toda e qualquer forma de ameaça contra os profissionais de imprensa. Segundo ele, esses atos constituem deploráveis ataques ao próprio regime democrático, valor universal dos povos civilizados. Tonet informou, ainda, que a instituição empenhará todos os esforços para que os autores sejam identificados, processados e punidos na forma da lei”, diz o texto divulgado pelo MPMG.
Fico feliz com a postura do Ministério Público, da Polícia Civil e do Sindicato dos Jornalistas. Espero que o autor dessas pichações seja encontrado e punido. Mas ele não está sozinho, infelizmente. Há vários outros destilando ódio ao vivo ou pelas redes sociais, seja contra jornalistas, contra congressistas, contra enfermeiros, contra cientistas, contra juristas – contra qualquer um que demonstre a existência de graves problemas neste projeto de poder fascista que chegou ao Planalto com a família Bolsonaro.
Volto a perguntar o que já perguntei aqui antes: e você, de que lado está? Dos que defendem a democracia ou dos que defendem cegamente tudo o que os bolsonarianos dizem e pensam?
Eu sigo sempre combatendo as coisas que estão gerando graves danos ao sofrido povo brasileiro: as fake news, a desinformação, o coronavírus (este causa danos para toda a humanidade, mas o Brasil está cada dia pior e já é o sexto em número de casos no planeta). E continuarei para sempre, orgulhosamente, a favor da democracia, do livre exercício do jornalismo, da liberdade de expressão, de comunicação, de pensamento e da liberdade artística.
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Cristina Moreno de Castro Ver tudo
Mineira de Beagá, jornalista, blogueira, poeta, blueseira, atleticana, otimista, aprendendo a ser mãe. Redes: www.facebook.com/blogdakikacastro, twitter.com/kikacastro www.goodreads.com/kikacastro. Mais blog: http://www.otempo.com.br/blogs/19.180341 e http://www.brasilpost.com.br/cristina-moreno-de-castro