
Quando você muda de cidade, fica um tempo razoável (às vezes dois meses, às vezes um ano) meio perdida, meio outsider, flutuante numa realidade paralela. É tipo aquele povo que muda pra Europa e fica fazendo as contas em reais, achando tudo absurdamente caro.
A gente começa a se habituar (até perceber que todas as cidades são essencialmente iguais) depois que descobrimos a padaria favorita, o mercado mais barato, o buteco de casa, a praça onde é possível caminhar, o salão pra cortar cabelo – o cinema mais acessível.
O primeiro cinema que me atraiu a São Paulo foi o Gemini. Tinha um jeito antigo encantador (embora nem fosse tão velho assim, com 35), passava filmes que tinham saído de cartaz dos outros lugares há meses, dava jujuba quando comprávamos pipoca e ficava perto do primeiro restaurante de comida mineira que conheci aqui. E o mais importante: tinha aquelas fileiras de dois lugares, como se fossem camarotes, que eram meu lugar favorito para ver o filme, a distância perfeita da tela. Ali vi “Piaf“, “O Lutador” e vários outros, que não vou lembrar agora.
Mas o Gemini fechou.
O segundo cinema que me atraiu a São Paulo, até pelo nome (idêntico ao de um cinema que gostava muito em Beagá), era o Belas Artes. Assim como no xará mineiro, lá só passava filmes que não eram blockbusters e muitos filmes brasileiros. Assisti a incontáveis. Cheguei a fazer a carteirinha, embora nunca tenha ido a um noitão (quando o pessoal vira a madrugada assistindo a clássicos temáticos). Comprei vários DVDs e CDs da banca que eles tinham lá dentro. Passei muitas vezes por aquela livraria. Tomei muito daquele café.
E agora o Belas Artes vai fechar.
Será que só vai me restar o Cinemark do shopping perto de casa, que só passa blockbusters (nada contra eles, mas é que gosto de TODO tipo de filme, sem restrições, desde que bons)?
Minha esperança é que o Belas Artes reabra, quem sabe ainda mais perto da minha casa, no meu bairro, a duas quadras, para que eu possa incorporá-lo à minha rotina e tragar a cidade de vez.
Saúde!
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Mesmo que eles consigam um outro lugar – e eu torço para isso – não será a mesma coisa. Ali, na esquina da Consolação com a Paulista, o Belas Artes está fincado.
É como tirar o Coliseu de Roma.
=/
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É triste mesmo quando arrancam uma parte da cidade assim. Achei o sobrenome do dono do imóvel bem apropriado.
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O que acho engraçado é que na fachada existe um dístico onde se lê “Desde 1952”, mas nas linhas do tempo publicadas tanto pela Folha como pelo Estado nada é mencionado sobre esse ano. Fala-se na inauguração, cerca de uma década antes, com outro nome, e nas trocas de nome, nenhuma delas em 1952. Muito estranho.
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Estranho é esse seu comentário ter ido parar no spam!
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Mesmo nunca tendo ido ao Belas Artes paulistano, belorizontino que sou, me dá muito pesar saber da notícia de seu fechamento. O mesmo pesar que me deu o fechamento do Usina em BH (mesmo que oficialmente tentem falar que é apenas para reforma), a ameaça do Cineclube Savassi pela falta de patrocínio e a eterna corda bamba em que andam todos esses preciosos estabelecimentos que nos proporcionam um respiro de arte em meio a tantos blockbusters e a singeleza de um estabelecimento de rua entre tantos cineplex de shopping. Destaco aqui que, como a Cris, não tenho nada contra os blockbusters nem contra os cinemas de shopping, mas acredito que a variedade de opções é uma riqueza e deve ser valorizada. Uma das grandes falhas da nossa sociedade moderna, a meu ver, é ignorar o passado para escrever o futuro, ao invés de fazer bom uso dele. Dessa maneira, vão-se casas com história para dar lugar a arranha-céus caça-níqueis, por exemplo. O estacionamento que ocupa e degrada o lugar onde viveu o lendário Cine Pathé, em BH, é pra mim um alarme a ser ouvido por empresas patrocinadoras, por produtores e investidores. A sociedade agradece.
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Belo comentário, Nando! Eu não sabia do Usina, fiquei triste com a notícia 😦
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