É difícil arriscar qualquer cenário nesses dias de noticiário político surtado, mas o mais provável é que, nas próximas horas, Dilma Rousseff, reeleita por 54,5 milhões de brasileiros, seja afastada por seis meses de seu cargo e dê lugar ao presidente ~interino~ Michel Temer. No momento em que escrevo este post, o governo entrou com mandado de segurança no STF — sua última cartada, após manobras fracassadas no Congresso e vários protestos nas ruas. Mas acho improvável que o Supremo interfira no processo do Legislativo.
Enfim, mesmo que interfira, agora ou no futuro, ou ocorra um milagre e o Senado não aprove a continuidade do processo de impeachment, vamos ser realistas: o segundo mandato de Dilma, que nem pôde começar, porque não deixaram ela governar até hoje, já acabou. Se esse processo de impeachment não passar, qualquer que seja a razão, entrarão com outros. E assim farão até que Dilma caia ou renuncie. É isso: vitória da oposição na base do tapetão.
O Brasil vive e viverá ainda dias muito tensos, tanto política quanto economicamente quanto nas relações entre as pessoas, dada a polarização e o fanatismo em que se encontra a sociedade. Impeachment é traumático. E não espero boas coisas de um governo de um sujeito como Michel Temer, com os aliados que ele tem. Mas também: lá estava ele no governo Dilma, num dos cargos mais importantes da República. Então, paciência.
A esta altura não sei mais o que comentar sobre o impeachment, ou o golpe. Ou sobre o pior Congresso que este país já elegeu e agora conhece de perto. O que pude falar a respeito saiu aqui no blog no dia 15 de abril e em outros dias. De lá pra cá, a Câmara aprovou a continuidade do processo com um placar razoável para os pró-impeachment, o orquestrador do processo de impeachment, Eduardo Cunha, foi afastado (o STF esperou tudo chegar bonitinho ao Senado para fazer isso, repararam?), a Comissão de Impeachment do Senado aprovou de novo a continuidade do processo com um placar de 15 a 5, e o presidente ~interino~ da Câmara, Waldir Maranhão, fez uma pataquada ainda muito mal explicada, anulando o processo e revogando a anulação poucas horas depois. Uma novela de ficção, daquelas que, se passasse no cinema, ia ser chamada de inverossímil e absurda, digna no máximo de entrar na categoria dos pastelões.
Não adianta esse grito de “não passarão” a esta altura ou espalhar hashtag de #nãovaitergolpe. Mesmo que o governo prometa entrar com um processo judicial atrás do outro, apelar a cortes internacionais etc. Bom, pelo menos é o que eu acho. Acabou. E, se eu fosse a presidente Dilma, tiraria uns dias de férias e descansaria a cabeça dos ataques infames que ela vem sofrendo em alguma praia agradável, com seu netinho, de preferência fora do Brasil. (Se eu fosse mesmo a presidente Dilma, teria aproveitado os últimos dias no cargo para canetar várias coisas urgentes no Brasil, que ela não levou adiante por medo, como taxar as grandes fortunas — um tema que meu pai aborda bastante aqui no blog).
Como não sou a presidente Dilma, resta-me apenas uma coisa: torcer para que a nova onda de governos conservadores que deve chegar ao Brasil nos próximos anos (talvez décadas, e me parece ser um ciclo mundial) não avacalhe demais as conquistas sociais e trabalhistas já garantidas, com muito custo, até agora. Que não haja retrocesso. E que consigam provar que podem fazer algo de bom pelo meu país. Porque, a esta altura, é só isso que me importa: muito além de questões partidárias ou mesmo de escopo ideológico, o que me interessa — e vou torcer por isso — é que o Brasil não saia dessa crise piorado. Faz favor.
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É um desejo meio complicado, porque uma quebra democrática como essa já demonstra que o futuro não vai ser bom. Mas a América Latina vem sofrendo um processo bastante claro contra toda a força de esquerda: Venezuela com o congresso igual ao daqui, Argentina (Macri ja fechou orgão que buscava desaparecidos políticos), Peru com a Fujimori, Equador com protestos, e a coisa toda começou no Paraguai, Chile tambem ja apresenta instabilidade. Sobrou Bolívia e Uruguai.Mas o Evo ja começou a sofrer algumas derrotas. Militares deixam um rastro muito sujo, política e justiça deixam a coisa mais limpa.Vamos aguardar esse futuro turvo e confesso que estou esperando retrocessos grandiosos.
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Acho que o mundo inteiro está passando por uma onda conservadora. Veja só: Donald Trump perigando ser presidente dos EUA! =O Mas, para nossa sorte, essas coisas são cíclicas. Por isso mantenho o otimismo: que o retrocesso não seja tão grande ou que esse ciclo conservador da vez seja rápido e indolor, do tipo band-aid. Vamos ficar na torcida.
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Invejo o seu otimismo (e todos os otimistas) Kika, mas rss http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/mendes-cede-a-aecio-e-diz-que-nao-ha-motivos-para-investigar
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Já vi esta Mas o Gilmar Mendes é do STF, e já estava lá bem antes de a Dilma ser afastada por 180 dias, né? E sempre foi esse *%$#@&^% aí 😛 😦
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Olha, Cris, nem eu sei mais direito no que dizer ou pensar sobre todo este momento delicadíssimo que passa o nosso país. E o pior é que não vejo muitas perspectivas positivas com ou sem Temer: um sistema político com mais de 500 deputados (só em nível federal) e 35 partidos se engalfinhando por cargos, deputados que são “eleitos” graças à proporcionalidade ( o quociente eleitoral), financiamento de campanhas por empresas… só uma reforma política para que pudéssemos ver uma luz no fim do túnel, mas acho que isso é muito difícil acontecer a longo ou médio prazo – talvez nunca aconteça. 😦
Também espero que o Brasil não saia desta crise piorado. Mas (olha eu pessimista novamente) pelo o que eu tenho observado, alguns retrocessos têm acontecido enquanto os holofotes estão voltados para o impeachment: aprovação de um projeto chamado “Escola Livre” (!) em Alagoas, onde os professores deverão manter a “neutralidade” em sala de aula para assuntos relacionados à política, religião e ideologia – um duro golpe contra a autonomia docente. E há mais projetos do tipo pelo Brasil. Na Bahia, na aprovação do Plano Estadual de Educação, a bancada evangélica conseguiu retirar do texto os termos “gênero” e “diversidade sexual” – e menos mal que foram apenas as palavras, pois queriam banir do plano tais conteúdos.
Enfim, um cenário não muito otimista. Desculpe a sessão desabafo…rs
PS: rabisquei uma charge muito parecida a do Duke, mas não foi plágio, não. rs
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Eu vi esse projeto da neutralidade: um horror! A censura em seu pior molde. Bom, tá difícil ser otimista, mas vamos que vamos! Ainda tem muita água pra rolar debaixo da ponte, como diz minha minha 🙂 Quero ver sua charge! Está no seu blog? Deixa eu espiar lá agora 😉
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É aquela reserva de esperança. rs Não postei no blog, só no Instagram e no Facebook. 🙂
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Vi agora! Muito boa 😀
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