Quando lembro que a saliva existe

Eram 5h20 quando acordei, com um alarme no meu cérebro. Algo doía. O que era? Permanecia um restinho do sonho, algo a ver com a matéria que vou fechar hoje. Árvores. Dor. Abri um olho. Engoli a saliva. É isso, a saliva dói. A saliva dói? Senti ela se formando, na minha boca, e escorrendo em direção à garganta, lentamente. Ali, alguma coisa emperrava, como se um caroço estivesse bloqueando a passagem e a saliva, insistente, o empurrasse, em braçadas de peito. Grummmp, seguia em frente, depois de muito arranhar o túnel no caminho. Gozado, nunca reparei que eu tinha que engolir tanta saliva assim, enquanto respirava deitada. Já tentaram deixar de engolir saliva, por alguma razão? Parece que, só de raiva, ela fica querendo cair mais. É como quando vamos ao dentista e ele põe aquele sugador horrível na boca, porque não podemos engolir a saliva. A gente presta atenção e, só por prestar mais atenção, parece que a saliva é produzida em maior quantidade. Quando prestamos atenção em algo que normalmente é feito sem que tenhamos que pensar a respeito (andar, piscar, respirar, engolir a saliva), é porque algo não está normal. Meu deus, será que estou virando hipocondríaca? Levanto. Acendo a luz. Espero a pupila se acostumar à claridade. 5h30. Olho para o espelho, de óculos, e tento enxergar minha goela. AAAAAAAH, de língua pra fora, como a gente aprende quando é criança. Enxergo duas bolas vermelhas na parede do fundo da garganta, inchadas. Hummm, deve ser por isso que sinto até a passagem da saliva. Mas, como não tenho o hábito de admirar minha garganta normalmente, fico sem saber se está mesmo inchada, ou se é daquele jeito mesmo. Volto a pensar que, se estou pensando sobre o ato de engolir a saliva, é que meu corpo me alerta que algo não está normal. Mas volto a pensar se, pelo fato de estar morando sozinha, estou virando hipocondríaca, com medo de minha garganta estar se fechando por alguma razão alérgica desconhecida e eu calhar de morrer sozinha. Lembro, no entanto, que nunca tomo remédios, nunca tive cólica na vida e raramente tenho uma mísera dor de cabeça. Não, Cris, você não está viajando. Sua garganta pifou mesmo. (Depois de três dias de pastilhinhas de mel com limão que não servem pra nada.) E assim, apenas 15 minutos depois de acordar, me convenço a pôr o agasalho, pegar um táxi e ir ao hospital, tomar uma superdose de antiinflamatório da veia e curar de vez essa faringite aguda.


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Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, escritora, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1, TV Globo, O Tempo etc), blogueira há mais de 20 anos, amante dos livros, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Autora dos livros A Vaga é Sua (Publifolha, 2010) e (Con)vivências (edição de autor, 2025). Antirracista e antifascista.

11 comments

    1. hahaha, será? 😀
      na verdade acho que meu medo é porque já vi minha mãe tendo crises alérgicas que fechavam a garganta dela e ela mal conseguia respirar; fiquei pensando como seria foda se isso me acontecesse sozinha em casa 😦
      sem sorvetes!! 😉
      bjos

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      1. Que agonia que dá ver essa injeção!
        É isso deve ser complicado mesmo…
        Melhoras menina, bjs

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  1. A madrugada e o estado entre sonolência e vigília despertam pensamentos aterrorizantes. Potencializa o medo e diminui a capacidade de resolução…nada que um bom despertar não resolva…
    Abraços. rs

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  2. Crous, se vc já vinha tomando pastilhas há três dias é porque não foi de uma hora pra outra que sua garganta pifou, né?….

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