Estava dirigindo a caminho do trabalho, na avenida Bias Fortes, quando o sinal fechou. Como de costume, olhei ao redor, pelas janelas, para ver se tinha alguma árvore bonita para admirar. Acabei fixando a visão em uma casa na rua Santa Catarina. O que me chamou a atenção não foi o imóvel de paredes azuis: foi sua varanda. Onde havia uma única cadeira e, sentado nela, um senhor de cabelos brancos.
De pernas cruzadas, bastante quieto, alguma coisa nele me pareceu inusitada. Demorei um tempo para perceber o que era: ele não estava fazendo nada. Não estava enfurnado em uma tela de celular. Não estava lendo um livro ou revista, nem escrevendo num caderno ou agenda. Não estava falando com ninguém nem fazendo contas numa calculadora nem ouvindo um radinho.
Ele estava apenas ali, sentado, imóvel, em silêncio, contemplando o movimento da rua.
Pensando.
E isso me fez pensar em quando foi a última vez que eu fiz algo assim. Que eu fiquei apenas sentada, silenciosa, observando o mundo ao redor e pensando.
Porque a verdade é que, hoje em dia, estamos sempre fazendo alguma coisa. Já repararam? Geralmente navegando num smartphone, estamos sempre: lendo notícias, respondendo a um zapzap, trabalhando, espiando as vidas dos amigos no Instagram, escrevendo, produzindo conteúdo, trabalhando mais, e assim por diante. No mínimo escolhendo uma música no Spotify para ouvir na playlist do momento.
No mundo atual – e isso é atual mesmo, coisa de dez anos pra cá –, é a coisa mais rara do mundo ficar, simplesmente, à toa. Falo por mim: quando tenho cinco minutos livres, já vou logo procurar uma coisa pra fazer. Pode ser abrir o livro do momento, pode ser atualizar este blog, ler mais notícias, resolver alguma coisa, passear com a cachorrinha, brincar com o filho, lavar vasilhas. Mas estou sempre fazendo alguma coisa.
Olhei (agora com inveja) para o homem de cabelos brancos sentado na varanda. Foram poucos segundos contemplando a cena em que ele contemplava a vida e os próprios pensamentos. Acho que, mesmo distante, ele notou meu olhar.
Deve ter ficado intrigado. Talvez a paz de navegar pelos próprios pensamentos seja corriqueira para ele. Talvez o inusitado seja este mundão de pessoas com cabelos ainda coloridos que parecem incapazes de tirar os olhos da tela do celular e observar a vida correndo, ao vivo, nas ruas, sob o sol.
Pensei em uma boa meta de produtividade para este 2024: separar mais tempos de pausas, em que eu me permita apenas pensar. Dar asas ao meu lado criativo, à minha memória e à minha imaginação.
E você? Quantos minutos reserva, por dia, para fazer esse nada tão necessário?

Você também vai gostar estes posts relacionados:
- 10 ideias para se desconectar da rotina de trabalho e das telas
- Como reduzir o uso do smartphone: 11 coisas que eu fiz e que funcionaram
- Pessoas em cargos de liderança estão EXAUSTAS
- Reflexões sobre trabalho, burnout e a importância do DESCANSO
- 1 ano após pedir demissão: como mudei minha vida
- Reflexões sobre a correria, a passagem do tempo, a vida adulta e o sentido (ou falta dele) nisso tudo
- Domenico De Masi, o ócio criativo e mais de suas ideias que ouvi em uma palestra
- Está com pressa? Por quê?
- Da importância do lazer
- Um mantra para tempos tão difíceis: faça só o que estiver ao seu alcance
- Como a meditação me ajudou a dormir melhor
- Sobre a inutilidade das preocupações
- Sempre deixa tudo pra depois? Veja dicas para não procrastinar
➡ Quer reproduzir este ou outro conteúdo do meu blog em seu site? Tudo bem!, desde que cite a fonte (texto de Cristina Moreno de Castro, publicado no blog kikacastro.com.br) e coloque um link para o post original, combinado? Se quiser reproduzir o texto em algum livro didático ou outra publicação impressa, por favor, entre em contato para combinar.
➡ Quer receber os novos posts por email? É gratuito! Veja como é simples ASSINAR o blog! Saiba também como ANUNCIAR no blog e como CONTRIBUIR conosco! E, sempre que quiser, ENTRE EM CONTATO 😉
Descubra mais sobre blog da kikacastro
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.



Tento sempre deixar pequenos intervalos para o “nada”. E desde o natal, tiro no mínimo meia hora por dia para ficar na rede fazendo “nada”. Melhor momento do dia!
CurtirCurtir
Excelente!!!! Tenho que aprender a fazer isso!
CurtirCurtir
Excelente artigo. Perto de fazer 80 anos, ainda não aprendi a fazer como aquele senhor do alpendre da casa na rua Santa Catarina. E não foi por falta de ensinamentos. Em 2007 assisti a uma palestra de Domenico de Masi sobre a importância do Ócio Criativo, tanto para quem o pratica, como para a própria economia. Até escrevi um resumo da palestra feita na Fundação Dom Cabral para sua revista, a DOM. É um dos posts relacionados no final deste artigo da Cris.
CurtirCurtir
Há quantos anos o Domenico de Masi fala sobre isso, né! E o Betrand Russell, então, fala há ainda mais tempo, conforme lemos naquele ótimo “Economia do Ócio”, que você me emprestou. E até hoje não aprendemos…
CurtirCurtir