A caixa-preta da BHTrans (e a do governo de Minas)

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Pouco depois que voltei a Beagá, ainda com o espírito de repórter de trânsito e transporte, abri três manifestações junto à Prefeitura de Belo Horizonte, solicitando, via Lei de Acesso à Informação (que vale pra qualquer cidadão comum), informações sobre o transporte público da cidade.

  1. No primeiro registro, pedi o relatório atualizado de índices, reclamações, denúncias e demais dados relacionados a cada uma das linhas de ônibus da cidade; punições aplicadas pela BHTrans para cada irregularidade; índice de atraso das linhas; quantidade de passageiros atendidos pelos ônibus de BH e comparação com números de 2011; índice de lentidão, principais vias congestionadas da cidade e comparação com 2011; gastos e investimentos da autarquia em 2012, por tipo.
  2. No segundo, pedi as infrações cometidas por motoristas de ônibus da capital, por tipo; quantidade de infrações e mais frequentes; quais linhas com mais infrações; as cometidas por trocadores de ônibus.
  3. No terceiro, pedi o número e detalhamento (carro/carro, carro/bicicleta, moto/bicicleta etc) de acidentes de trânsito em BH em 2012 e comparativo com 2011; as ruas onde houve mais acidentes e mais atropelamentos e as medidas adotadas nesses locais; quanto foi investido em 2012 em segurança de trânsito e campanhas educativas.

Meu foco era, naquele momento, principalmente o serviço prestado pelas linhas de ônibus, índice de congestionamento da cidade e índice de acidentes. Muito por causa de algumas matérias que eu tinha feito no G1 e também por já ter pedido os mesmos dados à CET, de São Paulo, em diversos momentos, e eles terem sido divulgados numa boa (muitos dos quais estavam disponíveis no site, como os índices de lentidão, o que me permitia tabular sozinha para fazer minhas reportagens).

Meus registros foram feitos em 3 de dezembro. No dia 28 de dezembro, recebi uma resposta dizendo que os “relatórios solicitados” estavam disponíveis na Ouvidoria-Geral do Município. Fui lá buscar. Referiam-se apenas ao primeiro registro e, mesmo assim, ainda estavam incompletos, sem os índices de lentidão, de atraso e quantidade de passageiros, dentre outros dados.

No dia 4 de janeiro, o assessor da presidência da BHTrans me procurou para agendar uma conversa pessoalmente. Por culpa mais minha que dele, tive que adiar a visita duas vezes e ela só aconteceu em 14 de março. Fui muito bem recebida, conversamos por bastante tempo sobre as políticas públicas da BHTrans para a cidade, mas a maioria dos dados que eu tinha solicitado não foram passados naquele momento. Outros, eles disseram que nem têm a medição, como os índices de congestionamento. Ficou combinado que os dados que mais me interessavam seriam passados para mim naquele mesmo dia, por email. No dia 19 de março, enviei o email reforçando os pedidos.

Nunca mais tive resposta. Depois, em 13 de maio, enviei um segundo email, também ignorado.

A Lei de Acesso à Informação, ainda tão pouco cumprida e subutilizada mesmo por jornalistas, prevê acesso imediato à informação solicitada ou, quando isso não for possível, um prazo de 20 dias, prorrogáveis por mais dez, para isso. E até hoje, passados sete meses, ainda não obtive todas as informações solicitadas.

Agora que os protestos tomaram conta das ruas da cidade e do país com um foco muito grande na qualidade e custo do transporte público, os pedidos feitos pela população e pelos jornalistas vão muito mais a fundo que os que eu fiz: querem ver os contratos, saber quais foram as propostas dos consórcios que participaram da última licitação, saber quanto lucram as empresas concessionárias do serviço público. Nada disso é informado e diz-se até mesmo que a própria BHTrans desconhece alguns desses dados. Oi? Ela não é o órgão público responsável por fiscalizar as empresas de ônibus da cidade? Ou então a BHTrans informa só percentuais, sem revelar os valores. O contrato em que o serviço se baseia também dá margem a vários problemas, por sua subjetividade.

Enfim, a caixa-preta continua vedada. E o que se mantém oculto pode esconder muitas falhas ou coisas mais graves, como corrupção ou benefícios indevidos a um consórcio em detrimento de outro. O usuário de um serviço em geral péssimo que se estrepe na outra ponta.

***

A Prefeitura ao menos tem um canal para registro de pedidos de informação e, embora demore ou deixe de prestar esclarecimentos, ao menos chegou alguma resposta. E achei surpreendentemente positivo me convidarem para a conversa na sede da BHTrans. Se quiserem registrar algum pedido de informação, CLIQUEM AQUI.

Já o Estado mineiro é muito pior. Solicitei em 28 de novembro duas informações à Secretaria de Estado de Defesa Social. A primeira delas foi respondida, com atraso e parcialmente, via publicação dos dados no site da pasta (mas não me mandaram nada por email avisando, etc). A segunda, muito mais importante para mim, jamais foi respondida por qualquer canal. Já se passaram mais de sete meses e nada. Meu protocolo continua guardado, esperançoso: 119552. O governo de Minas nunca foi transparente e eu ainda queria que cumprissem a Lei de Acesso à Informação… Sou mesmo uma ingênua. Quer registrar um pedido ao governo de Minas? Boa sorte! Sua tentativa pode ser feita CLICANDO AQUI.

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Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1 e TV Globo, UOL, O Tempo etc), blogueira há 20 anos, amante dos livros, poeta, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Antirracista e antifascista.

2 comentários

  1. Muito boas suas observações. Talvez o povo não consulte mais as fontes por falta de endereço. Deveria ser repassado nas comunidades. Reclamar às vezes funciona.

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