‘Pequeno Manual Antirracista’, de Djamila Ribeiro: um livro poderoso

Cartaz mostra desenho de punho cerrado, ou punho erguido, usado historicamente como símbolo de resistência contra a violência, contra o fascismo e contra o racismo.
Punho cerrado, ou punho erguido, é usado historicamente como símbolo de resistência contra a violência, contra o fascismo e contra o racismo. Foto: Clay Banks / Unsplash

Imagine um livro cheio de referências bibliográficas, que cita inúmeros estudos acadêmicos, dados, estatísticas, que trata de um tema árduo, que não é de ficção – nem de autoajuda – tornar-se um best-seller no Brasil?

Pois bem, esse livro existe: é o Pequeno Manual Antirracista. A autora dessa proeza é Djamila Ribeiro, que, além de escritora premiada, é ativista do feminismo negro, pesquisadora, mestra em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo e imortal da Academia Paulista de Letras.

Esse livreto pequeno, uma verdadeira pérola, venceu o Prêmio Jabuti de 2020, foi o mais vendido do país naquele ano e, desde então, já teve mais de meio milhão de exemplares vendidos. Um fenômeno.

Foi o último livro que li em 2023, por isso o acrescentei tardiamente à minha listinha de melhores do ano. Mas Djamila já tinha sido citada entre as mulheres mais admiráveis e inspiradoras de 2023, ao lado de outras pessoas incríveis ❤ Que bom que elas existem!

Graças a Djamila, milhares de pessoas (se não milhões) estão falando abertamente sobre racismo estrutural, racismo internalizado, negritude, os privilégios da branquitude, estão consumindo mais a cultura produzida por pessoas negras, estão apoiando mais as políticas afirmativas na educação e no trabalho, estão questionando a violência racial.

Mais pessoas estão percebendo, aos poucos, que não basta não ser racista, enquanto indivíduo – é preciso ser antirracista, em uma luta coletiva e social.

Como escreveu Djamila:

“Pessoas brancas devem se responsabilizar criticamente pelo sistema de opressão que as privilegia historicamente, produzindo desigualdades, e pessoas negras podem se conscientizar dos processos históricos para não reproduzi-los. Este livro é uma pequena contribuição para estimular o autoconhecimento e a construção de práticas antirracistas”.

Claro, embora tenha o nome de “manual”, ele “está longe de querer esgotar” o assunto, como a própria Djamila diz. Um assunto complexo demais, arraigado demais nas entranhas da sociedade, há séculos demais. Mas, justamente por isso, já está passando da hora de a pauta antirracista se tornar uma bandeira de tod@s, pessoas negras e brancas.

  • Não é aceitável que os negros sejam 55,8% da população brasileira e 71,5% das pessoas assassinadas. É desproporcional!
  • Não é aceitável que, entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios de não negros tenha caído 6,8%, enquanto, no mesmo período, a da população negra tenha aumentado 23,1%.
  • Não é aceitável que um jovem negro seja assassinado a cada 23 minutos no Brasil. Isso é o genocídio da população negra!
  • Também não é aceitável que dois terços dos presos no Brasil sejam negros. Que a prisão de mulheres (e quase 70% delas são negras) tenha aumentado 567,4% em quinze anos.
  • A maioria das presas são mães, sem nenhum antecedente criminal, e sem acesso a empregos formais. Metem-lhes o crime de tráfico de drogas (às vezes por um porte de menos de 1 grama de maconha) para que sejam postas atrás das grades. Isso também é a tortura da população negra!

Enfim, o capítulo que traz esses dados, sobre a violência racial, é só um dos 11 “passos”, digamos assim, que Djamila constrói no livro para ajudar as pessoas a abraçarem olhares e práticas antirracistas. Mas é o capítulo que mais dói na alma da gente. Porque é escandaloso – e porque os números não mentem.

Espero que este livro tão poderoso continue sendo muito vendido, neste 2024 e nos próximos anos, para que as palavras de Djamila cheguem a muitos lares, escolas e escritórios, tornem-se leitura obrigatória entre alunos e trabalhadores, sacudindo os brasileiros de sua letargia, de sua falsa democracia racial, de seu mito de Casa-Grande & Senzala – que já fez tão mal a tantas gerações.

Sim, existe racismo no Brasil. E ele é estrutural. Só cabe a nós reconhecê-lo e combatê-lo, dia após dia.

 

Capa do livro 'Pequeno Manual Antirracista', de Djamila Ribeiro“Pequeno Manual Antirracista”
Djamila Ribeiro
ed. Companhia das Letras
135 páginas
R$ 33,92 na Amazon (preço consultado na data do post; sujeito a alterações)

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Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, escritora, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1, TV Globo, O Tempo etc), blogueira há mais de 20 anos, amante dos livros, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Autora dos livros A Vaga é Sua (Publifolha, 2010) e (Con)vivências (edição de autor, 2025). Antirracista e antifascista.

2 comments

  1. Quando menino na roça eram negros os meus melhores amigos, com quem brincava junto com meu irmão um ano e meio mais velho. Eram filhos dos trabalhadores na fazenda onde meu pai era capataz. Talvez por isso nunca fui racista. Desse problema eu me livrei cedo. Mas, para reforçar essa convicção, vou ler o livro recomendado aqui.

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