Quando o cinema fabricava nossos sonhos

Para ver no cinema: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET (Hugo)

Nota 9

Quando o filme terminou, aconteceu uma rara cena: todo o cinema começou a aplaudir.

Tudo bem que isso é inócuo e até meio brega, quando não é uma pré-estreia e nenhum dos produtores do filme está presente para receber aquele reconhecimento. É quase como aplaudir o Hino Nacional, que aprendemos, desde criança, que é uma “gafe”, mesmo sem entender direito por quê.

Mas, todo modo, ver o cinema aplaudindo um filme é ver diversas pessoas, de idades variadas, libertando seu entusiasmo de forma incontida. (O que, diga-se de passagem, é mais raro ainda em São Paulo).

Pois lá estava eu, no fim da tarde de ontem, no cinema de um shopping metido de São Paulo, ouvindo todos aqueles aplausos, em uma sala cheia de crianças, de adultos e de vovôs.

Não é pouco.

“A Invenção de Hugo Cabret” é, realmente, um filme tocante, que merece aplausos. A princípio com cara de infantil, mas, aos poucos, mostra-se o filme de todos os cinéfilos, de todas as idades. O filme-homenagem de um grande diretor (Scorsese) para um gênio desta sétima arte (Méliès). Interpretado pelo garoto com os olhos mais azuis do planeta, e imensos, que não é uma maravilha em termos de interpretação, mas é lindo de ver, de todo jeito. E ele está apoiado por personagens incríveis e propositalmente caricatos, como o inspetor da estação de trem (Sacha Baron Cohen — sim, o próprio Borat), que dá a pitada de humor ao filme, o livreiro (Christopher Lee) e o próprio Georges (Ben Kingsley) — só ator peso-pesado.

O que vemos diante de nós é uma aventura como a dos livros de Dickens, num tempo já perdido, em que as fábulas são permitidas, o cinema é uma fábrica de sonhos e seus astros são apenas pessoas se divertindo bastante.

Pena que esse tempo foi enterrado com a 1ª Guerra, mas viva Scorsese por ressuscitá-lo brevemente para nossos tempos insossos de poucos aplausos.


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Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, escritora, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1, TV Globo, O Tempo etc), blogueira há mais de 20 anos, amante dos livros, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Autora dos livros A Vaga é Sua (Publifolha, 2010) e (Con)vivências (edição de autor, 2025). Antirracista e antifascista.

10 comments

  1. Várias pessoas já me recomendaram este filme. Estou doida para vê-lo!
    O último filme que vi o público aplaudir foi “A Música Segundo tom Jobim”. Dá vontade mesmo de aplaudir, como num show, ao final de várias músicas.

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  2. Cris, seu colega Alberto Dines, que antes de optar pelo jornalismo fez um curso universitário de cinema, também gostou desse filme, que ele chama pelo título americano (O artista e Hugo), como se lê neste artigo do Observatório da Imprensa: http://observatoriodaimprensa.com.br/news/view/a_metafora_e_o_jornalismo

    Para ele, o filme é também metáfora sobre as demais artes, inclusive o jornalismo. Explica: “Ambos têm a ver com o impacto das novas tecnologias e, apesar da enorme diferença de formatos, estilos e relatos, fazem a mesma aposta na qualidade do conteúdo, no poder da reinvenção, na perenidade da criação artística independente das circunstâncias e das tecnologias empregadas.”

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  3. Olá Cristina,
    “Pena que esse tempo foi enterrado com a 1ª Guerra…”
    não foi enterrado. nem perdido.
    Agora mesmo, aqui, li com sabor e bato palmas. Seu texto.
    Vou ver e vou curtir com certeza Hugo
    Dom Scorsese. Ponto .
    Abs, Toninho.

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