Um manual de redação antirracista para jornalistas

Manual de redação da Alma Preta, por um jornalismo antirracista
Manual de redação da Alma Preta, por um jornalismo antirracista

Já faz alguns meses que vi esta dica da minha colega e amiga Juliana Baeta, e hoje achei que valia a pena compartilhar por aqui, dando início a esta semana da consciência negra. Escreveu a Ju:

Encerrando mais um dia de aula, hoje, de Diversidade e Inclusão nas Organizações, aproveito para compartilhar a ótima dica do colega Danilo Lysei: o Manual de Redação da Alma Preta, que está disponível para ser baixado neste link: almapreta.com.br/manual-de-redacao.

Para quem gosta de manuais de redação e utiliza os clássicos como o da Folha até hoje, este da Alma Preta é uma belezura!

Além de mais atual e moderno que os demais, ele traz breves explicações sobre uso de palavras e expressões, e ótimos insights para o dia a dia de trabalho.

Vale a pena tê-lo por perto, não só para quem trabalha em redação, mas para profissionais de comunicação em geral, que atuam nas assessorias, em órgãos públicos, na publicidade, nas relações públicas…

Canal do blog da kikacastro no WhatsApp

A Ju já disse tudo, mas complemento: eu baixei meu manual de redação da Alma Preta e achei muito interessante essa perspectiva de “jornalismo antirracista“. Afinal, se queremos ser pessoas antirracistas e viver em uma sociedade antirracista, é fundamental que o jornalismo e outras formas de comunicação também pensem com essa mesma lógica, e atuem de forma antirracista.

O manual todo cumpre esse papel, ao trazer reflexões e ensinamentos a partir dessa perspectiva, mas a parte de que eu mais gostei foi a dos verbetes, que começa a partir da página 134.

12 exemplos de verbetes do manual de redação da Alma Preta:

Adolescente: Pessoa, com toda garantia de direitos, entre 12 e 18 anos de idade. É um período de transição entre a infância e a vida adulta, momento marcado por desafios e mudanças abruptas, desde corporais até alterações da dinâmica social. Adolescentes negras são criminalizadas no Brasil, descritas em alguns casos como “menores de idade” e responsabilizados como adultas. A Alma Preta reconhece os direitos desse segmento da população, não o criminaliza e o entende como uma vítima das desigualdades e do racismo na sociedade.

Cabelo ruim: Termo comumente utilizado para se referir a cabelos crespos e cacheados. A Alma Preta sabe que não existe um cabelo que seja bom ou ruim. Esses adjetivos são resultados do racismo estrutural que considera características negras como algo sujo, feio, ruim. A expressão é, portanto, racista. Utilize: cabelo crespo, cacheado.

Colorismo: De forma geral, o colorismo é a discriminação pela cor da pele. Assim, por conta do colorismo, a pigmentação da pele de alguém determina as formas de discriminação que essa pessoa sofre. Isso não significa, porém, que uma pessoa negra de pele mais clara será aceita nos mesmos espaços ou terá os mesmos privilégios que pessoas brancas, mas que há dimensões do racismo que atingem de formas distintas pessoas negras de pele escura e clara.

Denegrir: A palavra significa “tornar negro ou escurecer” e é utilizada comumente para apontar a situação negativa de manchar a reputação de uma pessoa. O questionamento é: por que o negro e o escurecer são associados, historicamente, a algo negativo? O racismo faz parte dessa resposta, por isso a Alma Preta prefere não adotar a palavra. Recomenda-se a substituição por: difamar, caluniar.

Escrava: A Alma Preta não utiliza o termo por entender que ele não representa a condição real do sujeito. A palavra indica uma desconexão entre o indivíduo e seu querer, sua humanidade em si, e naturaliza a condição da escravidão. Entende-se, aqui, que a pessoa é feita escrava e, portanto, não é escrava, mas está ou foi escravizada.

Favela: É entendido como um conjunto de casas construídas de forma irregular. São bairros nos quais diversas vezes há falta de políticas públicas, como saneamento básico, serviço de correios, entre outros. O IBGE identifica as favelas como um aglomerado subnormal. Na Alma Preta, não há problema quanto à utilização do termo “favela”. Esse espaço ganhou conotação positiva e de identidade para parte dos moradores dessas regiões.

Menor: É um termo utilizado, de forma errônea, para designar pessoas que tenham menos de 18 anos. É inapropriado usar a palavra porque é pejorativa, carrega um sentido de exclusão social que remete ao extinto Código de Menores e reproduz a discriminação racial e social. O termo ainda impõe a falta de direitos civis a essas pessoas, mesmo que sejam assegurados pela legislação brasileira. No país, uma pessoa com menos de 18 anos pode usufruir dos direitos civis, exercer obrigações e ser responsabilizada civil e criminalmente por seus atos.

Mulata: Termo utilizado para se referir a pessoas filhas de relacionamentos interraciais, cuja origem está associada à palavra “mula”, ou seja, o filhote infértil do cruzamento entre égua e jumento. Por conta de sua origem extremamente ofensiva e associada à desumanização de pessoas negras, a jornalista da Alma Preta não deve utilizar esse termo, salvo quando se referir a citações ou documentos históricos. Nesses casos, deve estar indicado que a Agência não compactua com o uso da palavra.

Negra: É uma identidade social de raça, com a qual se identificam a maior parte das pessoas autodeclaradas pretas e pardas. Para o IBGE, a categoria “Negro” se refere à soma dos dados de autodeclaração de cor de pretos e pardos. Esse reconhecimento faz parte de uma reivindicação dos Movimentos Negros brasileiros por entender que, ainda que existam nuances específicas, as experiências das pessoas negras no Brasil passam pela violência racista sistêmica, o que faz com que ser negra também seja considerado um marcador social.

Pessoa com deficiência: Termo correto e mais atual para se referir. Termos como portador de deficiência, pessoas com necessidades especiais, etc. não devem ser utilizados

Preta: É um marcador de cor. Para o IBGE, refere-se à cor da pele de uma pessoa, principalmente daquelas que se entendem como mais escuras. Socialmente, porém, é uma identidade social com a qual algumas pessoas com características fenotípicas específicas se reconhecem. Em alguns momentos, essa palavra é utilizada como sinônimo de “negra”, pois existe um processo de dar um novo significado sobre o ser negra no Brasil, com vistas a destacar o orgulho da própria negritude. Durante a cobertura, a Alma Preta dá preferência ao termo negra e se refere ao termo preta como um marcador de cor ou orgulho racial.

Racismo: O racismo é a discriminação racial sistemática, que atua no cotidiano, nas instituições, no Estado, na economia e nas relações interpessoais, de forma consciente ou inconsciente, determinando privilégios ou desvantagens aos indivíduos a depender da cor de sua pele.

 

Para baixar o manual e guardar aí no seu computador para consultar sempre, basta acessar este link.

 

Mais posts sobre racismo:

➡ Quer reproduzir este ou outro conteúdo do meu blog em seu site? Tudo bem!, desde que cite a fonte (texto de Cristina Moreno de Castro, publicado no blog kikacastro.com.br) e coloque um link para o post original, combinado? Se quiser reproduzir o texto em algum livro didático ou outra publicação impressa, por favor, entre em contato para combinar.

 

➡ Quer receber os novos posts por email? É gratuito! Veja como é simples ASSINAR o blog! Saiba também como ANUNCIAR no blog e como CONTRIBUIR conosco! E, sempre que quiser, ENTRE EM CONTATO 😉

Canal do blog da kikacastro no WhatsAppReceba novos posts de graça por emailResponda ao censo do Blog da Kikafaceblogttblog


Descubra mais sobre blog da kikacastro

Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.

Avatar de Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, escritora, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1, TV Globo, O Tempo etc), blogueira há mais de 20 anos, amante dos livros, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Autora dos livros A Vaga é Sua (Publifolha, 2010) e (Con)vivências (edição de autor, 2025). Antirracista e antifascista.

Deixe um comentário

Descubra mais sobre blog da kikacastro

Assine agora mesmo para continuar lendo e ter acesso ao arquivo completo.

Continue lendo