Minha irmã mais velha, a jornalista Viviane Moreno — mãe de uma linda menina –, estava andando na rua na última quinta-feira quando ouviu duas mulheres travando o seguinte diálogo:
— É menino ou menina?
— Menina.
— Bom, o importante é vir com saúde…
— Eu queria menina.
— Mas e o seu marido, não achou ruim?
Não é a primeira vez que ouço falar de mulheres e homens que falam que gostariam de ter um menino, que ter um bebê homem é melhor do que uma bebê mulher e outras coisas como esta entreouvida acima. Mas nunca tinha realmente escutado uma conversa tão surreal como esta.
Minha pergunta é: POR QUÊ?!?!?!?!? Tem certas coisas que não cabem na minha cabeça nem se empurrar com força, viu.
Aguardo as explicações dos leitores mais espertos que eu que conseguirem vislumbrá-las.

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O sociólogo holandês Geert Hofstede desenvolveu o conceito Masculinidade versus Feminilidade, ao estudar o comportamento das sociedades num grande número de países, entre eles, o Brasil, e os papéis atribuídos neles a cada sexo. Segundo ele, quanto mais fortemente forem esses papéis, mais masculina é a sociedade, predominando ali os seguintes valores: o herói é quem executa; realizar é mais importante do que estar; o grandioso é bonito, o pequeno é deplorável; o vencedor é enaltecido e o derrotado merece pouca simpatia; ser agressivo é positivo e buscar mais qualidade de vida e relacionamento é secundário.
Tirei os dados do livro “Gestão à Brasileira: Uma Comparação entre América Latina, Estados Unidos, Europa e Ásia”, da psicóloga Betania Tanure de Barros, que atualizou no começo deste século, quando professora da Fundação Dom Cabral, a pesquisa de Hofstede, feita três décadas antes.
Para mim, que nasceu no meio rural no interior de Minas na década de 1940, foi surpreendente descobrir que no Brasil o índice de masculinidade, segundo a classificação de Hofstede, perdia em muito para países como Japão (índice 95), Áustria (79), Venezuela (73), Itália (70), Suíça (70) e México (69). O Brasil vinha em 27º lugar entre 53 países pesquisados, com índice 49. Ou seja, o Brasil estava num nível intermediário da tabela que vai de zero a 100, sendo que quanto mais alto, mais “machista” o país.
Mais interessante foi ver que, três décadas após a primeira pesquisa, Betania descobriu que o índice brasileiro havia subido de 49 para 55, a indicar que havia crescido na sociedade brasileira as características consideradas mais masculinas, como competição e interesse pelo sucesso material, em comparação com as mais femininas, como ternura, generosidade e cooperação. As mulheres passaram a trabalhar mais fora de casa e, para ter sucesso na carreira, precisaram ser mais competitivas que os homens. Mais “machistas” que eles.
Tais dados explicam, talvez, o ouvido de duas mulheres pela Viviane, que por sinal acaba de ter a segunda filha, desempatando o jogo em casa, que estava em dois a dois, incluindo, aí, ela e o marido. Não se preocupem: a tendência, apesar da pesquisa da Betania, é que as brasileiras, com o tempo, vão ganhar esse jogo de disputa de poder em casa e no trabalho, pois, quando elas perceberem sua supremacia e ganharem confiança, vão poder contribuir mais para que o Brasil seja mais parecido com a Suécia (índice 5), com a Noruega (8), Holanda (14), Dinamarca (16) e com a Costa Rica (21).
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“Mas e o seu marido, não achou ruim?”
Pra mim, aqui está a aberração. Parece que a mãe foi à loja e comprou o objeto errado: Era pra comprar menino e ela trouxe uma menina! Olha, que displicente!
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Não é o fim do mundo? :O
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