Vale ver no cinema: O Quarto ao Lado (The Room Next Door)
2024 | 1h47 de duração | Classificação: 14 anos | nota 9
Há uns vinte anos, assisti no cinema ao filme “As Invasões Bárbaras”, de Denys Arcand, e me emocionei com a história de Rémy, que sofria um câncer terminal e foi encontrar paz em seus últimos dias na companhia do filho e dos melhores amigos – e de injeções de heroína.
Agora, coincidentemente no Dia de Finados, assisti ao mais novo filme de Pedro Almodóvar e, embora tenham se passado duas décadas entre um filme e outro, o tema da morte assistida, eutanásia ou suicídio – chame-se como quiser – continua com a mesma aura de tabu.
Não me lembro mais dos detalhes do filme de Arcand, mas, se não me engano, a morte assistida de Rémy também tinha sido feita às escondidas, em segredo. Aqui, em “O Quarto ao Lado“, de novo a eutanásia é feita com medo, com aquela ameaça de crime pairando sobre as cabeças das duas protagonistas.
Antes de voltar a esse assunto, uma pequena sinopse: a jornalista Martha, ex-correspondente de guerra, brilhantemente interpretada por Tilda Swinton, está sofrendo com um câncer terminal, sem sucesso nas várias tentativas de tratamento.
Ela resolve pôr um fim às dores excruciantes que sente e a esta luta indigna a que os pacientes terminais são submetidos. Consegue uma pílula na dark web e resolve vencer esta guerra à sua maneira.
Mas ela não quer estar só em seus últimos dias. E pede a uma velha amiga, com quem já não convivia há anos, para acompanhá-la nesta difícil empreitada. A amiga é a escritora Ingrid, também lindamente interpretada por outra baita atriz, Julianne Moore.

O filme aborda, com muita delicadeza, o convívio de Martha e Ingrid nesses dias, em uma bela casa de campo, cercada da poesia da orquestra de passarinhos e da neve que cai, igualmente, sobre vivos e mortos. Embora trate de um assunto tão triste, o filme de Almodóvar faz isso com muita doçura, muita serenidade, como se para nos mostrar que não tem nada de grotesco, trágico, absurdo, desesperador ou criminoso na busca por uma morte digna.
Por isso, ao contrário do que aconteceu no último filme de Almodóvar que vi, “Dor e Glória” (2019), que me fez chorar de soluçar, neste eu não derramei nem uma única lágrima. Até ri em algumas cenas. E penso que isso foi proposital: o diretor e roteirista espanhol quis nos mostrar que pode haver beleza e leveza até neste assunto que todos sempre varremos para debaixo do tapete.
Vamos todos morrer. Talvez até enquanto humanidade, e bem breve, se a hecatombe das mudanças climáticas continuar acelerada como está. Então não há porque vivermos fingindo que a morte não existe. É muito melhor nos prepararmos para ela, e melhor ainda se ela puder ser digna para todos.
(Parêntesis para dizer que, até para ter uma morte mais digna, como a relatada neste filme, é preciso ter dinheiro. Chegar a países como a Suíça, em que a morta assistida é permitida e para onde, recentemente, o poeta Antonio Cícero foi morrer, custa caro. Os pobres não têm nem esse direito.)
Acontece que vivemos em um mundo onde a eutanásia e o aborto ainda são tratados como crimes violentos, gravíssimos, por conta da danada da religião. Ajudar uma amiga a encontrar acolhimento, apoio, amor e carinho em seus últimos dias de vida é passível de cadeia. Não se pode sequer abordar esses temas em livros ou filmes sem atiçar a ira dos fanáticos religiosos ou a triste culpa cristã.
Por isso, filmes como “As Invasões Bárbaras” e “O Quarto Ao Lado”, com suas duas décadas de diferença, são tão importantes e impactantes. Por provocar a reflexão sobre diversos temas, mas, principalmente, sobre humanidade. Sobre a capacidade humana de encontrar criatividade e força para enfrentar todas as guerras e tragédias com algum motivo para sorrir. Até quando não houver mais nenhum.
Assista ao trailer de ‘O Quarto ao Lado’:
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Parabéns, Cris.
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O filme é bonito, papai, mas acho que você não ia gostar de ver. Porque tem todo esse foco na doença da personagem.
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