Em agosto de 2016, Dilma Rousseff, prestes a ser tirada do poder por um golpe político, fez um discurso profético, que previu vários acontecimentos dos anos seguintes. Relembre.
Texto escrito por José de Souza Castro:
“O mar da história é agitado
As ameaças e as guerras, haveremos de atravessá-las,
Rompê-las ao meio,
Cortando-as como uma quilha corta.”
Os versos acima são do grande poeta russo Maiakovski, que usei num artigo a respeito do discurso feito na sessão do Congresso Nacional que cassou o mandato da então presidente da República, intitulado: “Dilma escolhe Maiakovski como seu guia no inferno“.
Na última sexta-feira li um artigo do jornalista Álvaro Costa e Silva, na “Folha”, intitulado “Um Congresso ‘despudorado’ e ‘traficante’“. Iniciava assim:
“O Congresso Nacional é a fonte de corrupção do regime, é a massa plástica de todas as imoralidades que deprimem e aviltam a nacionalidade (…) É assim o Congresso Nacional, uma cidadela de negocistas repelentes, a sangrar o erário debilitado (…) É esse reduto de desfibrados o gerador das discórdias políticas que dividem a família brasileira (…) Para que serve esse Congresso despudorado, traficante, desacreditado perante a opinião pública?”
E logo esclarecia o brilhante colunista da “Folha de S.Paulo”:
“Calma no Brasil. Apesar da contemporaneidade e da virulência do ataque (que, de certa maneira, lembra as mídias sociais), o texto acima data de 1927. É um trecho do editorial do periódico A Manhã, no qual se reconhece o estilo de Mario Rodrigues, o jornalista panfletário que, entre outras mil coisas, foi o pai de Nelson Rodrigues e Mario Filho.
Corte para 2024, quase 100 após a diatribe de Mario Rodrigues. O Congresso não vai lá muito bem das pernas. Segundo recente Datafolha, ele é avaliado como ótimo ou bom por apenas 22% dos entrevistados; 53% o veem como regular e 23% o desaprovam.
O lobby reviveu uma figura transportada das trevas: Eduardo Cunha. Quase deu certo. Além dos bolsonaristas que, seguindo as ordens do chefe, ficaram abertamente ao lado de Brazão, integrantes do centrão usaram a tática covarde de se ausentar do plenário. Perderam por 277 a 129. Mais do que um desafio ao STF, o movimento foi um ensaio para a votação do projeto que busca anistiar Bolsonaro e o entorno golpista.
Enquanto isso, Arthur Lira trabalha para levar de volta à estaca zero o projeto de lei que regula as redes, deixando o campo livre para as cavilações de Elon Musk em parceria com a extrema direita transnacional. Só mesmo citando o pai do Nelson: ‘Massa plástica de todas as imoralidades’.”
Como antigo assinante do jornal, senti-me à vontade para transcrever o artigo, com o qual concordo completamente.
E volto agora a trechos do discurso de Dilma Rousseff, que pode ser conhecido na íntegra neste link depois da seguinte introdução:
“A presidenta afastada Dilma Rousseff discursou na manhã desta segunda-feira (29) por cerca de 45 minutos no plenário do Senado, durante a última fase do julgamento do processo de impeachment. Em sua fala, Dilma , ressaltou que foi ao Senado ‘olhar diretamente nos olhos dos que a julgarão’ e negou ter cometido crimes dos quais é acusada, segundo ela, ‘injusta e arbitrariamente’.”
Ou neste vídeo:
Em meu artigo no blog, no dia 31 de agosto 2016, destaquei alguns trechos do discurso (no qual ela cita Maiakovski) que foi pronunciado no mesmo dia em que 61 senadores (contra 20) a destituíram do cargo. Um deles:
“Acabam de derrubar a primeira mulher presidenta do Brasil, sem que haja qualquer justificativa constitucional para este impeachment.
Mas o golpe não foi cometido apenas contra mim e contra o meu partido. Isto foi apenas o começo. O golpe vai atingir indistintamente qualquer organização política progressista e democrática.
O golpe é contra os movimentos sociais e sindicais e contra os que lutam por direitos em todas as suas acepções: direito ao trabalho e à proteção de leis trabalhistas; direito a uma aposentadoria justa; direito à moradia e à terra; direito à educação, à saúde e à cultura; direito aos jovens de protagonizarem sua história; direitos dos negros, dos indígenas, da população LGBT, das mulheres; direito de se manifestar sem ser reprimido.
O golpe é contra o povo e contra a Nação. O golpe é misógino. O golpe é homofóbico. O golpe é racista. É a imposição da cultura da intolerância, do preconceito, da violência.“
Outro trecho esclarecedor:
“Com a aprovação do meu afastamento definitivo, políticos que buscam desesperadamente escapar do braço da Justiça tomarão o poder unidos aos derrotados nas últimas quatro eleições. Não ascendem ao governo pelo voto direto, como eu e Lula fizemos em 2002, 2006, 2010 e 2014. Apropriam-se do poder por meio de um golpe de Estado.
É o segundo golpe de estado que enfrento na vida. O primeiro, o golpe militar, apoiado na truculência das armas, da repressão e da tortura, me atingiu quando era uma jovem militante. O segundo, o golpe parlamentar desfechado hoje por meio de uma farsa jurídica, me derruba do cargo para o qual fui eleita pelo povo.”
Pode ter incomodado a imprensa hegemônica o que Dilma disse a seguir:
“Causa espanto que a maior ação contra a corrupção da nossa história, propiciada por ações desenvolvidas e leis criadas a partir de 2003 e aprofundadas em meu governo, leve justamente ao poder um grupo de corruptos investigados.
O projeto nacional progressista, inclusivo e democrático que represento está sendo interrompido por uma poderosa força conservadora e reacionária, com o apoio de uma imprensa facciosa e venal. Vão capturar as instituições do Estado para colocá-las a serviço do mais radical liberalismo econômico e do retrocesso social.”
Ela também foi profética nesta parte:
“(…) Ouçam bem: eles pensam que nos venceram, mas estão enganados. Sei que todos vamos lutar. Haverá contra eles a mais firme, incansável e enérgica oposição que um governo golpista pode sofrer. (…)
Esta história não acaba assim. Estou certa que a interrupção deste processo pelo golpe de estado não é definitiva. Nós voltaremos. Voltaremos para continuar nossa jornada rumo a um Brasil em que o povo é soberano.
Espero que saibamos nos unir em defesa de causas comuns a todos os progressistas, independentemente de filiação partidária ou posição política. Proponho que lutemos, todos juntos, contra o retrocesso, contra a agenda conservadora, contra a extinção de direitos, pela soberania nacional e pelo restabelecimento pleno da democracia.”
Cabe ao governo Lula reagir, depois da volta que vimos na História, a exemplo do que fez Leonel Brizola, que era também sabotado, como governador do Rio de Janeiro na década de 1980. Ele pagava por um espaço publicitário no “Jornal do Brasil” e depois em “O Globo”, para responder às críticas que eram feitas ao seu governo.
Lula não precisa imitar Brizola com o seu “Tijolaço”, muito lido. Ele tem hoje na Internet muito espaço oferecido pela imprensa progressista para se defender e propagar suas ações “para continuar nossa jornada rumo a um Brasil em que o povo é soberano”.
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