As crendices que a Petrobras tenta desmistificar na foz do Amazonas

A foz do Amazonas, que está na mira da Petrobras. Foto: Elsa Palito/Greenpeace Brasil
A foz do Amazonas, que está na mira da Petrobras. Foto: Elsa Palito/Greenpeace Brasil

Texto escrito por José de Souza Castro:

Em entrevista ao repórter Nicola Pamplona, da “Folha de S.Paulo”, o diretor de Exploração e Produção da Petrobras, Joelson Falcão Mendes, diz que é preciso “desmistificar” a relação entre a atividade petrolífera no litoral do Amapá e potenciais impactos ambientais na Amazônia.

Publicada na última sexta-feira (10), a entrevista deve ter sido feita dias antes, pois não faz referência ao assunto do momento – o desastre ambiental no Rio Grande do Sul.

A Petrobras não poderia ter escolhido pior momento para defender a liberação de licença ambiental para exploração de petróleo pedida há um ano e que vem sendo retardada, sob a alegação de que poderia afetar a floresta amazônica.

Imagem aérea do Parque Nacional do Cabo Orange, na costa do estado do Amapá, no extremo norte do Brasil. O local congrega biomas variados, como mangues e florestas tropicais (Foto: Victor Moriyama/Greenpeace)
Imagem aérea do Parque Nacional do Cabo Orange, na costa do estado do Amapá, no extremo norte do Brasil. O local congrega biomas variados, como mangues e florestas tropicais (Foto: Victor Moriyama/Greenpeace)

Com a descoberta de petróleo, a 170 km dali, em águas profundas da bacia Potiguar, a Petrobras iniciou nova ofensiva para reverter a negativa de licença ambiental. A descoberta confirmou a expectativa de que há petróleo na margem equatorial brasileira (bloco 59), a exemplo do que se viu nas vizinhas Guiana e Suriname.

“Supúnhamos que tinha hidrocarboneto naquela região e agora temos certeza”, disse Mendes.

Ele também manifestou certeza de que a exploração de petróleo em águas profundas a 170 km da foz de Oiapoque teria impacto ambiental mínimo*, mesmo porque não haveria necessidade de criar infraestrutura em terra.

Aves sobrevoam região no litoral do Amapá em que a Petrobras que explorar petróleo. Foto: Daniel Beltrá / Greenpeace
Aves sobrevoam região no litoral do Amapá em que a Petrobras que explorar petróleo. Foto: Daniel Beltrá / Greenpeace

Segundo a “Folha de S.Paulo”, o entrevistado é engenheiro formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e trabalha há mais de 30 anos na Petrobras. Já foi responsável pelas operações da estatal no Amazonas, Rio Grande do Norte e Ceará. Também ocupou posições executivas na bacia de Santos e Campos.

Mendes disse que todos os questionamentos feitos ao ser negada a licença ambiental envolvem coisas pequenas e as soluções apresentadas pela empresa ficaram sem resposta até agora. Exemplificou:

“O tempo de resgate do animal, no caso de um grande vazamento, é de 44 horas e o Ibama quer 24 horas? A gente bota a embarcação no meio do caminho. A base de Belém é muito longe? A gente faz uma base lá em Oiapoque.”

Parque Nacional do Cabo Orange no Amapá, Brasil. Foto: Enrico Marone/Greenpeace
Parque Nacional do Cabo Orange no Amapá, Brasil. Foto: Enrico Marone/Greenpeace

Conforme o diretor da Petrobras, para esse projeto foram direcionados “recursos, embarcações, em volume maior do que temos na bacia de Campos. Para atender a todos os desejos, para demonstrar que a gente vai fazer tudo o que tiver que ser feito”.

Há um motivo para isso: não há outras oportunidades para descobrir petróleo no Brasil como essa e, se não forem agregadas novas reservas, o país estará produzindo menos petróleo do que hoje a partir de 2035. Ele ponderou:

“Agora, se não quiser que haja exploração de petróleo na margem equatorial brasileira, aí não cabe ao Ibama. Não cabe ao ministro A ou B, cabe ao Conselho Nacional de Política Energética. E o fato é que, para fazer o leilão dessa área, em 2013, foi necessário um ok do ministro do Meio Ambiente”.

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A Petrobras planeja investir US$ 2,5 bilhões nas bacias de Campos e Santos fazendo poços lá, mas sabe que não vai mais descobrir nenhum campo gigante, como Marlim, Roncador e Tupi.

Ele lembrou que depois da desistência da BP (British Petroleum), vencedora do leilão, a Petrobras herdou um processo de licenciamento bem adiantado e, então, contratou uma sonda para fazer esses três poços: o bloco 59 e os dois poços da bacia Potiguar. “Era essa sequência. Estava adiantado o processo de licenciamento. Simples assim”.

O diretor de Exploração e Produção da Petrobras, Joelson Mendes. Foto: Agência Petrobras
O diretor de Exploração e Produção da Petrobras, Joelson Mendes. Foto: Agência Petrobras

Mendes garantiu que a exploração do bloco 59 não necessita de muita estrutura, como gasodutos. “Estrutura de apoio são embarcações, hoje em dia extremamente modernas, e helicópteros. Hoje, em Belém, você tem tudo isso. Dá para fazer de Belém”, disse.

Então, por que tanta resistência dos ambientalistas? Joelson tem uma explicação curiosa:

“Qual é a questão da Amazônia? É floresta. Em que um poço a 170 quilômetros de Oiapoque, ou uma produção que vem a ser robusta, afeta? Demos um grande azar de um dia terem colocado naquela bacia o nome da Foz do Amazonas. A marca registrada da Amazônia, isso é forte pra caramba, imagina colocar oito, dez plataformas lá. Mas o bloco 59 nada tem a ver com a Amazônia, só está na bacia sedimentar chamada Foz do Amazonas. Você gosta de Búzios, Ipanema, Leblon? Tem muito mais plataforma que isso lá. Entendeu? São crendices que a gente está tentando desmistificar.”

***

* Nota da Cris: Em 2017, o Greenpeace lançou o documento “Amazônia em Águas Profundas – Como o Petróleo Ameaça os Corais da Amazônia“, do qual tirei algumas fotos que ilustram este post, que parece discordar do diretor da Petrobras quanto ao “impacto ambiental mínimo”. A atual ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também considera a exploração de petróleo na região “altamente impactante“.

 


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Por José de Souza Castro

Jornalista mineiro, desde 1972, com passagem – como repórter, redator, editor, chefe de reportagem ou chefe de redação – pelo Jornal do Brasil (16 anos), Estado de Minas (1), O Globo (2), Rádio Alvorada (8) e Hoje em Dia (1). É autor de vários livros e coautor do Blog da Kikacastro, ao lado da filha.

3 comments

  1. Na noite de ontem, a Petrobras anunciou que vai pagar R$ 13,4 bilhões em dividendos e juros sobre o capital próprio, referente a parte do lucro líquido do primeiro trimestre deste ano, de R$ 23,7 bilhões, que foi 38% inferior ao registrado no mesmo período do ano passado. Serão pagos R$ 0,52 por ação, em agosto e setembro próximos, referentes às ações preferenciais em circulação até 31 de março deste ano. Ou seja, acionistas da estatal não têm do que reclamar da atual administração. Vão embolsar 56,54% do lucro líquido!

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  2. Li há pouco no site Poder 360 uma boa notícia. Lula vai poder cumprir uma de suas promessas de campanha: não privatizar mais nenhuma refinaria. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a principal estatal brasileira foi obrigada a assinar com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) um termo de compromisso para vender à iniciativa privada oito de suas 13 refinarias. Apesar da pressão de Bolsonaro, a Petrobras só vendeu uma refinaria na Bahia (Relam) e duas no Amazonas (Reman) e no Paraná (SIX). Ao assumir, Lula suspendeu os processos de venda da Repar (PR), Refap (RS), Regap (MG), Renet (PE) e Lubnor (Ceará). Se tudo desse errado, com a reeleição de Bolsonaro, metade da capacidade de refino poderia sair da Petrobras, aquela do “petróleo é nosso” dos tempos de Getúlio Vargas e de Monteiro Lobato, para o poderio estrangeiro.

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