Das alegrias do violino – e sua conversa com a percussão

Ricardo Herz Trio (Foto: CMC)

Sempre considerei o violino um instrumento sisudo.

Nada a ver com a audácia dos saxofones e trompetes, com a alegria dos pianos, a agitação das baterias e percussões ou os gemidos desbaratados das queridas gaitas. Bonito, sim, como não. Como a harpa é bonita. Mas meio sem sal.

Era isso que eu achava dos violinos, meio sem personalidade, meio macambúzios e melancólicos — até Ricardo Herz entrar no palco do Teatro Brincante, na Vila Madalena, na última sexta.

Ele entrou com o violino em punho (ou em cangote), olhando de baixo pra cima para todo mundo, como se estivesse perscrutando o auditório. Mas já tocando suas primeiras notas.

Logo depois, entrou no palco o segundo protagonista do show, Pedro Ito. O nome do trio é “Ricardo Herz Trio“, e espera-se sempre que o artista que nomeia a banda seja sua figura central, mas Ricardo divide os louros o tempo todo com seu amigo Pedro.

Pedro cuida da bateria, dos cajons, do pandeiro, de mil e um instrumentos de percussão que nem sei nomear. Mas ele não apenas dita o ritmo para que o violino de Ricardo dance: eles conversam o tempo todo, e os dois brilham, parecem estar improvisando, se olham várias vezes, sorrisão na cara, cumplicíssimos, como se estivessem se divertindo muito mais que todos nós e bolando novas notas para os próximos segundos.

Ricardo pula freneticamente de um lado pro outro, dança, balança a juba presa numa faixa amarela, sorri franzindo o nariz, como se estivesse ofuscado pelo sol, sua, queima mil calorias. Seu violino não é nada sisudo, afinal. Toca chorinho, forró, valsa, ritmos africanos, gaúchos, jazz. É música popular brasileira tocada por um sujeito que tem toda a erudição da música clássica, de orquestra, em sua formação, e estudou nos melhores lugares mundo afora.

Já Pedro deixa os ombros arqueados, corcunda, coloca o queixo pra frente enquanto deixa os olhos semicerrados, como se estivesse num transe, como aquelas pessoas que dizem receber espíritos, enquanto suas mãos parecem se multiplicar por dez e tocam em mil lugares diferentes da sua percussão, rapidíssimas.

E os dois só mudam a pose para se olharem de novo, conversando mais uma vez o violino com a percussão. Blablablablablablablablablabla: a plateia adora a experiência musical, não sabe pra onde olhar, aplaude de pé!

Ao fundo, a cozinha caprichada é do violão de sete cordas de Michi Rusitschka, que funciona como um baixo e pouco faz intervenções nos solos de Ricardo e nas conversas de Pedro. Mas é um complemento essencial para o trio.

Pra melhorar o show, Ricardo chama ao palco o artista Antônio Nóbrega, que também toca música popular no violino, mas também dança, é meio Charles Chaplin, e tem letras inteligentíssimas. Tem 60 anos, é artista há 40, e pula com a agilidade de um menino de 10.

Nóbrega para Ricardo: “Este é o violinista que eu queria ser!”

Ricardo para Nóbrega: “E este é o artista que eu sonhava ser!”

Não me interessa qual dos dois é melhor, se o de 60 ou o de 34 anos, ambos premiados e reconhecidos no meio musical.

O que me importa é que, feliz da vida, descobri as alegrias do violino, e não me canso mais de ouvir:

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Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1 e TV Globo, UOL, O Tempo etc), blogueira há 20 anos, amante dos livros, poeta, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Antirracista e antifascista.

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